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quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Com que roupa eu sou?

Andamos pelas ruas, vamos ao trabalho, pegamos ônibus, carona, vamos à balada, comemos num boteco, bebemos com os amigos, vamos a um casamento ou a um velório... Cada uma dessas ocasiões demanda um tipo de traje. Será?
Quando olhamos para um colega de classe de jeans e tênis pensamos: o cara está indo pra aula, ou para a casa de algum colega jogar vídeo game, bem, ele não deve estar indo num aniversário, porque aquela camiseta tem um furinho perto do pescoço e a gola ta meio frouxa. A menina de vestido e sandálias deve estar indo ao shopping cm as amigas fazer compras, ou com o namorado ao cinema, não deve estar indo atender na emergência de um hospital, não é mesmo? Certo?

Errado.

Ambos eram colegas de classe de uma turma do último ano de medicina, e estavam indo trabalhar nos postos de saúde. Ele estava indo para a Lagoa e ela para a Costa. Ambos gostam de pessoas, gostam de atender, gostam de clinicar e gostam de estudar a mesma coisa: atenção primária. Por que então são tão diferentes?
Porque são indivíduos distintos, não um único ser. Ao colocarem a bata branca sobre as vestes transformam-se num símbolo: o DR/DRA.

Dona Maria saiu de casa às pressas, dormia seu sono pós almoço e acabou se atrasando para a consulta na Costa da Lagoa. Chegando esbaforida na porta do Centro de Saúde se depara com uma moça alegre, ajudando a Dani (a agente comunitária) a arrumar a árvore de Natal na recepção do posto. Enquanto o Bruno procura seu prontuário a moça ouve o nome da dona Maria e a saúda: Dona Maria, esperava mesmo pela senhora! Eu sou a aluna nova do Dr Arthur, estou estudando no último ano de medicina e queria saber se a senhora deixa eu fazer a sua consulta desta vez.
Surpresa pela recepção a senhora consente, e recebe um abraço da estudante que a conduz até a porta do consultório. Lá elas conversam sobre os problemas que tanto afligem a dona de casa, trocam experiências e até mesmo algumas gargalhadas. Depois de alguns minutos, a estudante conversa com o Dr Arthur e juntos decidem a melhor conduta para o caso. A estudante leva o pré-resultado à paciente que se mostra um tanto incomodada por ter de usar tantos remédios... A estudante resolve então fazer um pacto terapêutico com Dona Maria, ambas conversam, descobrem onde cada uma pode ceder e o que será melhor para o dia a dia da paciente, e assim a paciente sai do consultório satisfeita, com a decisão terapêutica, que foi concluída também com a sua opinião.
Enquanto isso no posto da Lagoa, o colega coloca seu jaleco e chama o próximo paciente. Era o senhor Genésio, que estava com depressão (diagnóstico escrito o prontuário). O jovem aprendiz perguntou ao paciente se ele havia tomado a fluoxetina e se tinha melhorado dos sintomas de hipersonia e astenia. Seu Genésio olhou para o estudante e falou: Ô Dr, o Paulão não vem hoje não? O estudante sorri e responde: Está na sala do lado, logo vou levar seu caso para ele.
Seu Genésio fala pouco durante a consulta, manos ainda durante o exame.
Quando o estudante chama o Dr Paulo, o paciente pede para ter um particular com o Dr. E então se abre com o seu médico de confiança.
No fim do dia, Dr Paulo vai conversar com seu aluno e explica a ele que nem sempre precisamos estar vestidos como doutores, ou mudar nosso jeito de falar ou agir para que os pacientes confiem na gente, o importante é saber achar a porta para o coração deles, para que eles possam se abrir com você, e confiar. Precisamos ser nós mesmos, humanos, esse sempre é o caminho mais curto, mais fácil, natural. O vínculo médico paciente não é uma amizade, é um pacto de segurança em que ambas as partes saem beneficiadas pela doação mútua. Não há relação médico-paciente sem confiança.
Enquanto isso, na Costa da Lagoa, a doutoranda é chamada pelo Dr Arthur para uma advertência. Não deveria mais vir de trajes como vestidos, ou saias, especialmente atender sem jalecos, pois isto não era uma postura de médica, e que “as pessoas estavam comentando”. Muda, ela pensou nas aulas e nas literaturas a que teve acesso e pensou: Será Meu Deus, que estou entendendo tudo errado?

Será que ela está?

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

As Lei de Newton e as Lei Orgânicas do SUS

Sobre as leis de Newton

Na busca pelo erro no Sistema Único de Saúde, pensando, pesquisando, experiementado, pensei: Deve ser algo óbvio! Todas as grandes descobertas são óbvias, mas além de ninguém se dá conta delas e, aqueles que o fazem não as descreve em palavras. Como diria um grande amigo meu: "até mesmo o óbvio precisa ser dito". Vamos então às proposições e devaneios da quintanista de medicina.

1a lei: A primeira lei explica que a gravidade é a força de atração mútua que os corpos materiais exercem uns sobre os outros.
Essa é a comprovação científica que temos para explicar os erros do sistema de saúde do Brasil.

SIM!

Como nunca pensei nisso?
Em 4 anos e meio de medicina, enterrada em livros, correndo no campus entre uma aula e outra, olhando para os pacientes e tentando desvendar o que lhes acometia naquele momento, só naquele momento, eu me esqueci de me e lhes perguntar: o que lhes aflige na sua vida? O que você acha que lhe deixa doente? Você é feliz? Era feliz até eu me meter na sua vida e te internar nesse hospital? O que gosta de fazer, de comer? Tem filhos? (...)

Meu Deus, faz quanto tempo que eu não "enxergo" as pessoas como semelhantes, como iguais? Há quanto tempo eu me esqueci de tratar as pessoas mas sim às doenças?
Ontem me vi fazendo a seguinte pergunta à uma mãe de um paciente meu: "Gisele, alguma INTERCORRÊNCIA desde a última consulta?" Ela me olhou como quem olha uma imagem de um santo, com aquela mistura de cara de paisagem e desejo de esperança. Onde foi parar minha humanidade? Agora sou uma ser desumano - meu primeiro diploma de medicina; ainda me falta o de técnica, falta 1 ano e meio.
Voltando às leis de Newton. Pensemos juntos - se os corpos se atraem mutuamente, por então o médico foge tanto desse vínculo?!
Eu já sei a resposta, mas vamos nos dar a chance de pensar mais, para descobrirmos juntos.
2a. lei de Newton: os corpos inertes e os que estão em movimento tentem a manter seus estados de origem. Bem, isso só nos confunde, pois assim pensamos que os médicos continuam inertes enquanto o povo morre, adoece e sofre, dia a dia.
3a lei de Newton: toda ação é seguida de uma reação.
Ah! Agora impossível não concluirmos, conjuntamente, a lógica do erro do SUS.

A formação médica!
Por quê?
É simples. O médico ao atender um indivíduo tenta imprimir o status de "paciente" - palavra em duplo e ambo sentido - primeiro: esperar mais de 2h numa fila é um ato de extrema e desumana paciência; segundo: paciente é o indivíduo passivo, que segue as ordem de outrem, nesse caso, o médico. No entanto, isso não é instantâneo e, muito menos, fácil de se fazer.

"Construímos muros demais e pontes de menos." (Isaac Newton)

É imprescindível que exista uma relação de confiança entre a dupla (médico-paciente). Assim como o médico causa uma impressão e passa uma imagem, traz um impacto... o paciente não o faz? Faz? Acabou?
Não!
O paciente também causa um impacto no médico! Por mais que se tente ensinar aos estudantes, por 6 anos, que devemos nos envolver o mínimo, evitar a contratransferência para "podermos"ajudar o outro, nós somos ensinados na verdade a ir contra as leis naturais e dificultamos o contato e a troca.
Fazer saúde é ser HUMANO, no sentido PURO da palavra, sofrendo as açõoes e reações que qualquer outro indivíduo, com ou sem diploma sofreria. Isso é natural, é orgânico, é implacável e insubstituível.
Enquanto caminharmos contra os caminhos da natureza só estacionaremos a evolução do atendimento de saúde. Talvez, possamos substituir os professores de medicina por mestres de física, o que acham?