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domingo, 26 de abril de 2009

Tragédia burocrática

Dia 19 de abril, 19h, ocorre um acidente na estrada de Rancho Queimado, cidade localizada nas proximidades de Florianópolis, capital do estado. Chego no hospital dez minutos antes do início do plantão, a tempo de ajudar no atendimento de um garoto de menos de 18 anos que caiu de skate e cursou com diminuição do nível de consciência e agitação psicomotora, seguido de um coma induzido e transferência para a UTI.
A dúvida da junta, e o burburinho geral era o fato do moleque ter ou não usado alguma droga, já que ele estava "agitado" demais segundo a equipe. No entanto, é sabido de todos que os hematomas gerados em episódios de TCE pode, e cursam, com diminuição do nível de consciência e agitação psicomotora... Por que então muitos faziam questão de indagar uma suposta intoxicação exógena?

Essa história se prorrogou por muitos dias, o menino estava com hematoma e sofreu procedimento cirúrgico, quando então cursou com melhora do quadro e pode sair da UTI.

Minutos depois do atendimento ao menino ouvi uma estagiária comentar que havia ocorrido um acidente em Rancho Queimado com um ônibus de turismo Argentino, e muitos passageiros viriam para o nosso hospital receber o atendimento.
Perto da meia noite foram chegando as primeiras vítimas do acidente. Duas horas antes já estavam todos na porta, paramentados com luvas, aventais, óculos, inclusive o staff (médico que só vemos 1 vez na vida e outra na morte)...
As vítimas chegaram.

Parecia um circo, todo mundo tão prestativo e trabalhando.

Nada de grave, a não ser um paciente com luxação e fratura de quadril e joelho direito.
Algumas suturas, muitas contusões e hematomas; nada digno de nota aqui, muito menos educativo. Esperávamos ver acidentados graves, mas o que vimos foi um show de ralados!

O diretor clínico do hospital andava pra cima e para baixo anotando nomes, com tanta delicadeza, cheio de sorrisos para nós, cheio de boas noites para todos os pacientes. Havia representantes da embaixada pelos balcões, com folhas e mais folhas de protocolos... Uma verdadeira palhaçada, já que aquilo ali era um hospital, pelo menos até aquele dia, e não um balcão de burocratas...
O staff não nos deixava dar 1 ponto sem a presença do residente ou dele próprio do nosso lado. Isso fez com que o trabalho se alongasse madrugada a dentro.

Hora de dividir os horários.

Peguei o 1o horário, atendemos alguns pacientes que chegaram, acidentes domésticos, acidentados de motocicleta. Fizemos todo o atendimento sozinha, eu e minha dupla.

Por que diabos agora nãe era necessária a supervisão?

Nessas horas eu queria ter nascido na Argentina!

sábado, 18 de abril de 2009

Os Iguais

O pior de saber que se é diferente é saber que você acaba distanciando as pessoas que você mais ama, devido à sua escolha. Ser diferente implica não em vestir as calças do avesso ou puxar uma franja pra frente dos olhos. Independente da aparência, é se diferente e ponto final. O diferente vem de dentro, do jeito de olhar as coisas ao redor, da necessidade de impedir o errado, do desejo de ver o certo, o bem. É incondicional e não pode ser ensinado ou aprendido, se nasce diferente. Por isso é tão difícil se aproximar dos iguais... Os iguais não são menos dignos ou pessoas simples, eles têm suas características, qualidades e defeitos, mas o maior problema não é o fato de serem iguais, mas sim o fato de eles pensarem que são capazes de torná-lo um igual.
O processo de ser diferente vem de um tempo de aceitação que muitas vezes demora anos, você muitas vezes relutou insistentemente para ser como a maioria, para ser “normal”, mas foi humanamente impossível para você, eu sei disso, comigo não foi diferente.
Os anos se passaram e eu me casei. Casei-me com um igual, e conseguia tolerar bem as diferenças, basicamente o amor supera quase tudo, e o que não superava nos fazia brigar, bater de frente, pestanejar, mandar embora. Pra logo depois pedir desesperadamente para ficar.
Eu queria gostar de alguém mais fora dos padrões então, que não se “encaixasse” tão bem, mas que pelo menos fugisse pra mim toda vez que o mundo caísse na sua cabeça, que sofresse com o meu sofrimento e vivesse comigo a minha dor e a minha angústia. Mas que posso fazer eu, se me coração dispara por esse tão igual quanto os outros?
Tentei inutilmente me interessar pelos seus interesses, mas me falta algo; não sei se a rispidez dos iguais não lhes é percebida entre si, mas a mim me afasta, e muito, desse mundo. Eu não consigo ser igual, nem o amor conseguiu me modificar; mas eu o amo com todas as minhas forças, amo seu cheiro, seu beijo, seu abraço, o jeito caipirão dele falar e o jeito como me pega no colo ou lava meus pés no banho.
Pura ilusão.
Sei bem que ele provavelmente daria graças a Deus pelo fim do relacionamento, pois esta é uma característica dos iguais: fugir dos problemas ou do que possa causar problemas. Os diferentes já iriam querer discutir, reajustar, chorar, reclamar, mudar (sim, os diferentes têm essa capacidade) e jamais desistir, porque quando eles tomam uma decisão, dificilmente é por impulso. Os diferentes são terríveis, quase maquiavélicos, eles agem de caso pensado... Se não fossem tão emotivos poderiam dominar o mundo (risos)... Apesar que esse jamais seria o objetivo de um diferente.
Os diferentes são sonhadores e até mesmo lunáticos; são idealistas, defensores dos seus direitos, péssimos receptores de ordens, são brigões e dificilmente começam uma briga sem terem plena certeza de que estão certos.
Odiamos as fraquezas dos iguais... Enquanto eles odeiam nossa rigidez. Ambos têm razão.
Aprendi muito com ele, a convivência me fez ver que os diferentes podem ser mais iguais e não serão menos felizes; mas acho que os iguais não são tão flexíveis, eles têm sede de mudança e buscam sempre mudar o pobre do diferente, e aí vem o sofrimento.
Não se pode pensar na totalidade das personalidades, precisamos descobrir uma forma intermediária de ser, para ser e fazermos feliz.
Até lá, vou tentando, descobrindo, aprendendo... A vida é mesmo uma escola, de más maneiras.